quinta-feira, junho 16, 2005

A Casa

Enquanto o táxi segue em alta velocidade pela estrada olho a noite e as árvores no escuro. Tudo parece negro à minha volta e apenas a sensação de que já aqui estive me traz algum consolo. No meio da melancolia indico um destino diferente do que desejava e dou por mim perto da nossa infância. Os locais são os mesmos mas estão completamente modificados pelo tempo e a minha angústia aumenta. Será que vou reconhecer as casas? Será que vou reconhecer os caminhos que percorria em criança? Será que te vou reconhecer?

O táxi continua mais devagar e não digo ao condutor que não sei se quero estar ali, não digo que podemos estar perdidos e continuo a olhar para dentro de todas as casas. Lembro-me das mais antigas e das tardes passadas entre companheiros de aventuras. Mas tudo está diferente, todos os recantos envelheceram e eu sinto que a ligação com o meu passado está ameaçada.

Por fim vejo a casa onde entrei tantas vezes, a casa onde brincávamos inocentemente e todas as recordações voltam para encher a minha cabeça. Vejo luz e olho para dentro à procura de alguma cara conhecida, sinto um conforto enorme ao ver os mesmos móveis, os mesmos objectos, ao ver que alguma coisa ainda está igual. Peço para irmos mais devagar e tento desesperadamente reconhecer tudo, tento guardar o passado dentro de mim.

De repente vejo alguém, uma figura conhecida sentada a ler. Mal consigo ver o teu rosto, mas sei que és tu pois estás exactamente como sonhei. Volto ao passado e já não estou no táxi, estou sentado contigo à porta de tua casa e a noite é infinita. Temos dez anos e falamos sobre o futuro, sobre o queremos ser quando formos crescidos, sobre nós dois.

Sou trazido de volta ao presente por uma voz que pergunta algo, tenho vontade de sair do carro e bater à tua porta, de reconhecer a tua cara e a tua voz, de voltar a olhar para o céu de mão dada contigo. Num impulso pago o táxi e fico sozinho na noite a olhar para uma janela, não sei o que vou encontrar, não sei se me vais reconhecer, mas avanço determinado em direcção ao meu destino.

1 comentário:

trigolimpofarinh@mparo disse...

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[Sorriso]