domingo, julho 10, 2005

Viagens

À beira da ruptura olho para os carros na rua e penso na vida, nunca me senti assim tão desorientado, sem saber para onde caminho. Sigo as luzes vermelhas que se afastam de mim, outras vidas que seguem para longe e apesar de não fumar puxo de um cigarro apenas para ver os efeitos do fumo que sobe em direcção às estrelas. Olho para cima mais uma vez como se daí pudesse vir algum auxilio, algo que explique o estado em que me encontro. Estou sozinho e nunca tive tanta gente à minha volta...

Sei que tenho tudo para ser feliz e que a angústia permanente não faz sentido. Procuro desesperadamente uma solução, um caminho que me faça viajar daqui para fora. Do alto da varanda, com o vento a bater-me na cara, continuo a olhar para as outras vidas que passam e saio de dentro de mim.


Viagem

Vítor estava cansado, guiava sem parar há duas horas e sentia-se a adormecer. A discussão com Clara tinha sido a pior de todas as que já tinham tido e não aguentara ficar em casa. Entrara no carro sem saber que destino levava, só sabia que tinha de sair, que precisava de pôr as ideias em ordem e pensar no seu futuro. Não conseguia continuar, tinha de parar.

Dentro do carro, numa rua desconhecida, continuava a ouvir a mesma música que o acompanhava há dias e desejou estar noutro sitio, desejou estar na praia com que sonhara há muitos anos e que ainda não tinha descoberto. Passado tanto tempo conseguia ainda lembrar-se de todos os pormenores desse sonho, o mais intenso que alguma vez tivera na vida e que lhe deixara uma vontade enorme de fugir, de abrir a porta de casa e sair, viajar pelo mundo, encontrar o sitio que sabia ser seu. Fechou os olhos e sonhou.


As ilhas

Rui sentiu o trem de aterragem tocar o chão com algum alivio, nunca apreciara especialmente viajar daquela forma, mas desta vez estava mais incomodado do que o costume. Talvez fosse pelo facto de nunca ter estado tanto tempo dentro de um avião, ou talvez fosse por ir ao encontro do seu destino, ao encontro dele próprio.

Mal saiu do avião sentiu que estava num sitio diferente, sentiu um ar quente e húmido que nunca tinha sentido antes. Todo o seu corpo parecia doer e por momentos fantasiou que estava noutro planeta onde as leis mais básicas da física não se aplicavam. Sabia que tinha finalmente chegado a casa...

Saiu do hotel e dirigiu-se à praia, caminhou descalço por entre as árvores estranhas até à areia branca e olhou para o mar azul. Não estava demasiado calor e uma brisa com um cheiro adocicado batia contra a sua cara, era capaz de ficar ali para sempre. Finalmente estava no sitio com que tinha sonhado toda a vida e que achava lhe ia trazer a solução para todas as perguntas sem resposta.

De repente ouviu um som, uma música, olhou para trás à procura de alguém mas a praia estava deserta. O único sitio de onde poderia vir era uma pequena igreja pintada de branco que tinha sido construída mesmo em cima da areia. Parecia bastante antiga e deslocada daquele sitio e quando fechou os olhos teve medo de não a voltar a ver, mas ela ainda estava à sua frente quando os voltou a abrir.

Entrou na velha igreja e sentiu que de alguma forma conhecia aquele sitio, a cor dos bancos, o chão irregular, as figuras que olhavam para ele, tinha certeza que já aqui tinha estado, por muito que isso fosse impossível. Era o seu sonho, sabia isso, mas tinha medo do que ia encontrar, tinha medo das respostas que procurava há tanto tempo.

Continuava a ouvir a música e agora tinha a certeza que era a mesma que ouvira anos atrás numa noite que nunca esquecera, era a mesma música que ouvia na sua cabeça sempre que precisava de ter a certeza de que existia, de que era uma pessoa real e não um sonho.

Apercebeu-se de repente que este era o último momento de dúvida, que era a última vez que poderia fazer certas perguntas, que a partir dali tudo seria diferente. Sentou-se num banco e tentou concentrar-se naquele momento único da sua vida, tentou memorizar todos os pormenores, tentou não esquecer-se de si próprio...


Noite

Continuo na varanda a olhar para o carro que parou à porta do meu prédio. Lembro-me de um sonho antigo e sei que todas as respostas estão dentro de mim, sei que só eu posso acabar com toda a ansiedade que sinto a cada momento. Olho para cima e choro uma última vez, choro porque sofro, choro porque ainda não consegui perceber que estranha música é esta que não me sai da cabeça.

E sonho, sonho que estou num local distante e que entendo...

1 comentário:

xein disse...

As respostas, para tudo, cabem bem dentro de nós. É preciso é querer aceitá-las e isso nem sempre acontece....

O título é mais apropriado para esta época: férias, sem post's, sem nada.....


Sente-te!!!