quarta-feira, maio 18, 2005

No Metro

Vejo alguém sorrir a meu lado e não percebo porquê. Olho para os olhos azuis e vejo uma cara transformar-se por completo, como se não fosse a mesma pessoa, como se de repente a que estava à minha frente tivesse desaparecido e sido substituída por outra completamente igual, mas mais feliz.

Não existe contacto visual entre nós dois e posso observar aquele sorriso e tentar imaginar uma vida...


Outra Vida

Joana caminhava pela rua devagar e pensava na vida, pensava na ansiedade que não a largava nas últimas semanas e em toda a tristeza que tinha acumulada dentro dela. Era uma pessoa com uma vida normal mas que sentia precisar de algo mais. Esta angústia vinha dos tempos de criança, na altura tinha medo do mundo, tinha medo de coisas simples que a assustavam muito e deixava-se levar para um mundo de sonhos e fantasias.

Apesar de tudo tinha sido uma criança muita risonha e feliz, o problema começara quando crescera e os sonhos tomaram conta da sua vida. E quanto mais viajava por mundos cada vez mais incríveis, mais se afastava da realidade e das outras pessoas. Chegara aos trinta anos sem namorado, com poucos amigos e com uma família que via pouco, sentia-se sozinha e quando isso acontecia fugia para o seu mundo de faz-de-conta.

Naquela tarde de Setembro as árvores tinham uma cor muito bonita com o sol a bater nas folhas amarelas, um Outono que tinha chegado mais cedo, como se tivesse vindo fazer companhia aos pensamentos melancólicos de Joana. Estava triste e não sabia como mudar o que sentia, olhava para o mundo à sua volta e tentava que o bonito fim de tarde a ajudasse a sorrir.


Uma flor

Cansada de tanto andar, cansada de pensar, sentou-se num banco da sua rua preferida e observou as pessoas que passavam. Olhou para as pessoas que caminhavam depressa com uma expressão muito séria e riu-se para dentro pensando que deviam ir fazer alguma coisa muito importante, só isso podia justificar os semblantes tão carregados. Ela esperava não ser assim também aos olhos dos outros, esperava ser mais do tipo triste mas com um rosto simpático, o tipo de pessoa de quem todos gostam, era isso que queria ser.

De repente sentiu que alguém a observava, olhou para baixo e reparou numa miúda que não devia ter mais de três anos e que olhava para ela fixamente. Nas mãos tinha uma pequena flor amarela que agarrava com muito cuidado como se tivesse medo que ela caísse, como se estivesse a segurar algo muito valioso e que não podia ser substituído.

Disse-lhe olá e perguntou como é que ela se chamava, a única resposta que obteve foi um esticar de braços. Baixou a cabeça e olhou para a flor no meio de duas mãos pequenas sujas de terra, as pétalas eram amarelas e o centro da flor era cor-de-laranja e conseguia sentir o ligeiro perfume que ela deitava. Agarrou suavemente na flor com uma das suas mãos enquanto passava a outra pelo cabelo castanho da pequena. Ela esperou uns segundos e olhou-a como se pudesse ler os seus pensamentos e sorriu como nunca ninguém tinha sorrido para Joana, um sorriso que encheu a sua tarde.


Depois

Joana entrou no metro ainda a pensar no que tinha acontecido e em vez de fugir para os seus mundos, ficou apenas de olhos fechados a relembrar o sorriso que lhe tinham oferecido e do resto da tarde sentada num banco apenas a saborear a vida.

Reparou que a seu lado alguém a observava, estava a sorrir desde que entrara na carruagem e nem tinha pensado que não estava sozinha.

Olhou para o rapaz e sorriu para ele.

1 comentário:

Lenore disse...

Em vez de Joana podia ter o nome de Claudia.Tirando a flor,podia ser eu!!!